O Centro de Valorização da Vida (CVV) foi fundado em 1962 e realiza apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar – 24 horas por dia e sob total sigilo e anonimato. A instituição sem fins lucrativos participou da elaboração da Política Nacional de Prevenção do Suicídio, do Ministério da Saúde. A linha 188 está disponível em todos os estados do país e, em 2019, os mais de três mil voluntários foram responsáveis por atender quase 3,5 milhões de contatos.

Principalmente neste momento de pandemia e transformações em diversos campos, o serviço do CVV se mostra fundamental. A voluntária Patrícia Fanteza falou à ABMT sobre o trabalho da instituição e o impacto na vida de quem encontra do outro lado da linha um local pacífico de acolhimento.

Como funciona o trabalho do Centro de Valorização da Vida (CVV)?

É um trabalho humanitário feito por voluntários que se mobilizam e são treinados para oferecer uma conversa de acolhimento, permitindo que a pessoa que nos procura possa despressurizar e desabafar dentro de uma conversa sem nenhum tipo de julgamento, crítica ou emissão de opinião. O que fazemos é terapêutico, mas não é terapia. Não existe uma continuidade, um acompanhamento, é uma conversa pontual na qual prometemos sigilo e anonimato. Quem liga não precisa sequer se identificar.

Como é feito o treinamento dos voluntários?

Eles passam por cerca de 12 semanas de treinamento para aprender a ter essa expressão neutra. Por ser um trabalho humanitário, pode ser feito por qualquer pessoa acima de 18 anos que queira aprender as técnicas para a escuta neutra, acolhedora e alinhada à filosofia do trabalho do CVV. Temos engenheiros, vendedores, psicólogos, todo tipo de profissão em nosso time de voluntários.

Diante da pandemia de COVID-19, vamos fazer cursos de formação de novos voluntários no formato online. Também oferecemos treinamentos para que essa pessoa tenha um desenvolvimento constante e possa se aprimorar. Não é uma estrutura solta, essa continuidade de estudos é importante também para nosso autoconhecimento.

Quais cuidados o CVV toma durante a conversa?

A primeira coisa é ter em mente e garantir que aquele é um espaço de quem liga. A pessoa pode falar a respeito do que quiser e quem está em foco ali é ela, não o voluntário. A gente sabe que é muito comum na sociedade deixarmos um pouco de lado a habilidade de ouvir. Muitas vezes a gente conversa com alguém já pensando no que vamos responder e sem parar para ouvir o que o outro está falando. As pessoas não estão acostumadas a permitirem que o centro seja realmente o outro, e esse entendimento é o que move o CVV a criar esse espaço de acolhimento. A essência do nosso trabalho é que a pessoa se ouça através do outro e reflita sobre o que ela mesma está falando.

O CVV atende em todo o Brasil?

Temos cerca de 140 postos no país, estamos presentes em todas as grandes cidades de todos os estados. Atendemos pelo número nacional 188 e também pelo chat do site do CVV. Atualmente nossos atendimentos presenciais estão suspensos. Tem pessoas que mandam carta, e-mail, o objetivo é estar acessível para todos. Nas redes sociais nós sempre indicamos informações bacanas, como cartilhas e orientações sobre diversos assuntos. Temos outras frentes, como o CVV Comunidade, que presta apoio a vítimas de tragédias como Brumadinho, o incêndio da boate Kiss.

Quais foram os impactos da pandemia de COVID-19 no atendimento do CVV?

É difícil falar especificamente sobre isso devido à confidencialidade do nosso trabalho, mas o que temos percebido é que este é um momento muito particular para cada um. Cada pessoa está sentindo de uma maneira diferente – para alguns pode ser um momento de solidão, para outros pode representar mais dificuldades de convivência… Cada um vivencia esse momento de uma maneira.

Nesse período de pandemia e isolamento social, vimos nascer diversas iniciativas solidárias. Na sua opinião, essa preocupação com a dor do outro é algo passageiro ou veio para ficar?

A gente costuma brincar que sonha com o dia em que o CVV não seja mais necessário, pois as pessoas terão respeito e enxergarão o outro naturalmente. Essa pandemia tem nos convidado a olhar para as coisas de uma maneira que a gente nunca tinha olhado. Passamos a valorizar mais a presença do outro, enxergamos mais grandiosidade em atos simples como um beijo ou um abraço.

Não quero de maneira alguma coisa romantizar um momento extremamente sério, que traz muitas reflexões. Mas quem sabe seja um convite para percebermos que nós precisamos do outro e que esse cuidado com as pessoas e com o planeta é fundamental para a manutenção da nossa espécie. Quem sabe seja um começo para podermos refletir e nos redescobrir como humanidade.